VALMIR ANDRADE - A verdade em cumprimento do dever.

domingo, 24 de maio de 2009

UMA VIDA DEDICADA AO SERVIÇO





Dom Helder Camara, antepenúltimo filho do guarda-livros e maçom convicto João Eduardo Torres Câmara Filho e da professora Adelaide Rodrigues Pessoa Camara, nasceu no dia 7 de fevereiro de 1909, um domingo de Carnaval, em Fortaleza, Ceará. Dos 13 filhos do casal, cinco morreram em 29 dias, em consequência de uma epidemia de crupe, mais tarde conhecida como difteria. O menino Helder recebeu a primeira comunhão aos oito anos de idade e, aos 14, entrou no Seminário da Prainha de São José, em Fortaleza, onde fez os cursos preparatórios, depois filosofia e teologia.
Em 15 de agosto de 1931, aos 22 anos, ordenou-se sacerdote e, em seguida, foi nomeado diretor do Departamento de Educação do Estado do Ceará. Cinco anos depois, transferiu-se para o Rio de Janeiro. Durante os 28 anos de permanência na cidade, colaborou com revistas católicas, organizou o 36º Congresso Eucarístico Internacional, fundou a Cruzada São Sebastião para atender moradores das favelas cariocas e o Banco da Providência, destinado a ajudar famílias na faixa da miséria.
Exerceu funções na Secretaria de Educação, Ministério da Educação e Conselho Nacional de Educação e organizou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Episcopal Latino Americano (Celam). De 1952 a 64 ocupou o posto de primeiro secretário-geral da CNBB e de 58 a 66 foi delegado do Brasil no Celam e seu vice-presidente. As duas entidades foram os instrumentos de apoio para a implantação de um modelo de Igreja progressista, que tinha como base a opção preferencial pelos pobres.
Dom Helder recebeu a sagração episcopal em 20 de abril de 1952 sob o lema "In Manus Tuas", que indicaria toda sua vida entregue nas mãos de Deus. Logo depois tomou posse como bispo auxiliar do Rio de Janeiro. A promoção a arcebispo auxiliar do Rio de Janeiro chegou em 1955, quando estava com 46 anos. No dia 14 de março de 1964, foi indicado pelo papa Paulo VI para ocupar a Arquidiocese de Olinda e Recife, cujo titular, dom Carlos Coelho, falecera semanas antes.
Por ocasião da nomeação, dom Helder, que se encontrava em Roma participando de uma reunião da Comissão Conciliar do Apostolado dos Leigos, declarou: "Volto de coração aberto a tudo e a todos, com sede de diálogo, na linha absoluta do Concílio Vaticano II". Esse concílio, realizado de 1962 a 1965, definiu, entre outras coisas, compromisso com as soluções dos problemas sociais e econômicos e fortaleceu a Igreja progressista. A imprensa estrangeira viu assim a nomeação: "Homem do papa Paulo VI no Recife".
No Recife de 1964, as autoridades civis e militares receberam com satisfação a indicação do novo arcebispo. "Estou consciente do acerto da nomeação e grato pela futura presença de dom Helder, cujas qualidades todos conhecem", disse o vice-governador Paulo Guerra, no exercício da chefia do Executivo. O então comandante do 4º Exército, general Justino Alves Bastos, afirmou que "dos abraços afetuosos que aqui receberá, os primeiros, por certo, serão os meus". O prefeito do Recife, Pelópidas Silveira, falou do orgulho que a cidade sentia com a nomeação de dom Helder, lembrando "sua atuação em defesa dos princípios de justiça social".
O governador Miguel Arraes, que se encontrava no Rio de Janeiro, em entrevista ao jornal Última Hora, disse que a indicação de dom Helder "traz grande alegria e satisfação aos pernambucanos". O vigário capitular Lamartine Soares - mais tarde seu bispo auxiliar e grande amigo - determinou que os sinos de todas as igrejas da Arquidiocese de Olinda e Recife repicassem festivamente às 6h, 12h e 15h, no domingo 15 de março, saudando o novo arcebispo.
NO RECIFE - No dia 11 de abril de 1964, um sábado chuvoso, dom Helder desembarcou, às 15h30, no Aeroporto dos Guararapes, que se encontrava lotado. Dali, em carro aberto, seguiu para a Matriz de Santo Antonio, na Avenida Dantas Barreto, onde falou para milhares de pessoas, debaixo de chuva, antes de seguir para o Palácio dos Manguinhos, residência oficial do arcebispo, na Avenida Rui Barbosa, bairro das Graças.
Em sua mensagem publicada na íntegra pelos jornais, dom Helder disse que era "um nordestino falando a nordestinos com os olhos postos no Brasil, na América Latina e no mundo. Um cristão dirigindo-se a cristãos, mas de coração aberto, ecumenicamente, para os homens de todos os credos e de todas as ideologias. Um bispo da Igreja Católica que, à imitação de Cristo, não vem ser servido, mas servir".
À multidão, afirmou também que, a exemplo de Cristo, devia ter um amor especial pelos pobres, velando, sobretudo, pela pobreza envergonhada e tentando evitar que a pobreza se resvale para a miséria. Disse que a pobreza pode, às vezes, ser um dom generosamente aceito ou até espontaneamente oferecido ao Rei, e que a miséria é alvitante porque fere a imagem de Deus.
Antes de falar ao povo, o novo arcebispo pediu para não isolarem frases de seu discurso, por conta da situação política do momento - em 31 de março de 1964, os militares tomaram o poder, derrubando o presidente João Goulart e os governadores do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, e de Pernambuco, Miguel Arraes. "Só o conjunto da mensagem dá uma idéia exata da minha alma", justificou dom Helder.
POSSE COMO ARCEBISPO - No dia 12 de abril ele tomou posse como 30º bispo e 6º arcebispo de Olinda e Recife, em cerimônia na secular Catedral da Sé, em Olinda. Três dias após a sua chegada, recebeu o título de cidadão pernambucano, conferido pela Assembléia Legislativa.
Em 27 de maio de 1969, sofreu um duro golpe: seu braço direito na arquidiocese, o jovem sacerdote Henrique Pereira Neto foi trucidado. O bárbaro assassinato - atribuído às forças de repressão, que tinham em dom Helder seu grande desafeto - revoltou a cidade e levou o arcebispo a se manifestar através de nota. Ele chamou a atenção das autoridades não somente para o esclarecimento do crime, mas também para o clima que levava as pessoas e grupos a agirem tão brutalmente. "Nem sabemos ao certo para quem apelar. Confiamos em Deus e na Justiça", desabafou.
Muita emoção no dia 8 de julho de 1980. Do papa João Paulo II, em visita ao Recife, dom Helder recebeu o título de "irmão dos pobres e meu irmão". Em 15 de agosto de 1981, importante momento: o cinqeentenário de sacerdócio. Do Vaticano, uma semana antes, o papa enviou mensagem elogiando dom Helder. "Todos sabem e reconhecem como a benignidade de Deus o acumulou de dotes, talento e piedade. Ornando com esses dotes, desde a tua promissora juventude até hoje, tens conseguido cumprir numerosas missões de inestimável valor", disse João Paulo II.
APOSENTADORIA - Ao completar 75 anos, em 1984, ele renunciou à Arquidiocese, que conduziu por 20 anos. Somente em julho, porém, deixou o cargo, após a posse do novo arcebispo, dom José Cardoso. Ao completar 80 anos, numa terça-feira de Carnaval, foi festejado pelo povo, autoridades e novamente pelo papa João Paulo II. O santo padre enviou mensagem desejando-lhe "graças e consolações divinas a fim de continuar, em serena longevidade, servindo aos irmãos, sobretudo aos que sofrem a pobreza".
O tempo em que permaneceu na Arquidiocese, dom Helder desenvolveu uma linha de trabalho declaradamente em favor dos mais pobres e na defesa dos direitos humanos. Em sua gestão foram concebidos, por exemplo, o Encontro de Irmãos (grupos de pobres evangelizando pobres), a Operação Esperança (para atender as vítimas das enchentes) e a Comissão de Justiça e Paz (defensora de presos políticos e perseguidos pela ditadura militar).
V neste Blog.

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